Angela Biaggio

Revisão de 13h25min de 23 de novembro de 2023 por Andreriopreto (discussão | contribs) (Boletim do Portal)
(dif) ← Edição anterior | Revisão atual (dif) | Versão posterior → (dif)

Angela Maria Brasil Biaggio (1940-2003) foi uma das pioneiras na pesquisa psicológica no Brasil. Nascida em 1940 no Rio de Janeiro, dedicou-se sistematicamente à investigação do Desenvolvimento Moral com base na teoria do Julgamento Moral de Lawrence Kohlberg (1927-1987), quando essa teoria ainda era desconhecida no Brasil. Ela também se dedicou aos estudos acerca da ansiedade e raiva, adaptando e validando escalas de avaliação desses espectros para sua utilização no país. Suas obras no campo da psicologia educacional são amplamente utilizadas na formação de professores. Foi casada com Luis Isnard Leão Biaggio, com quem teve dois filhos: Ana Cristina e Maurício. Faleceu em 2003 no Rio Grande do Sul, em decorrência de um câncer no pâncreas.

BiografiaEditar

Formação acadêmicaEditar

Angela Biaggio nasceu no Rio de Janeiro em 20 de julho de 1940. Durante seu ensino médio, realizou um intercâmbio nos Estados Unidos durante um ano. Lá, pode conviver com uma família americana e frequentou uma escola local. Essa experiência a influenciou ir para os Estados Unidos após sua graduação para cursar seu mestrado e doutorado.

Ela realizou sua graduação em Psicologia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Na Universidade de Wisconsin-Madison nos Estados Unidos, obteve seu título de mestrado em 1965, sob orientação de Julian C. Stanley. Na mesma universidade, entre 1965 e 1967, sob orientação de Robert E. Grinder, desenvolveu sua tese de doutorado estudando os diferentes aspectos do Desenvolvimento Moral. Ela aposentou-se em 1988, mas permaneceu como orientadora de mestrado e doutorado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) até a data de seu falecimento. Em 1994, ela cursou o seu pós-doutorado na University of North Dakota (UND), nos Estados Unidos.

Carreira profissionalEditar

Angela integrou o corpo docente do curso de Psicologia da PUC-RJ em 1968. Em 1969, foi aceita como membro da American Psychological Association (APA). No início dos anos 1970 foi professora no Departamento de Psicologia da Minnesota State University Moorhead – EUA. Em 1972, foi docente na Universidade de Brasília (UnB) e atuou como professora e pesquisadora na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Entre 1974 e 1980 permaneceu no Rio de Janeiro trabalhando junto ao psicólogo Aroldo Rodrigues na PUC-RJ.

Entre 1976 e 1978, quando o Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) organizou o primeiro comitê para a área da Psicologia, Angela foi uma das representantes convidadas. Em 1981, ela retornou para Porto Alegre a convite de Juracy Marques, dessa vez para integrar o corpo docente da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atuando no programa de pós-graduação na área de Psicologia Educacional. Em 1986, colaborou no planejamento do curso de mestrado em Psicologia passando a integrar esse corpo docente em 1987. Em 02 de maio de 1988, no Ato de Fundação da Sociedade Brasileira de Psicologia foi aclamada Presidente Honorária. E entre 1991 e 1993, Angela foi presidente da Sociedade Interamericana de Psicologia.

TeoriasEditar

O Desenvolvimento MoralEditar

Devido aos estudos para a elaboração de sua tese de doutorado – orientada pelo professor e psicólogo Dr. Robert E. Grinder –, Biaggio debruçou-se sobre os diferentes aspectos do Desenvolvimento Moral: afetivo (culpa), cognitivos (julgamento moral segundo a tipologia de Kohlberg) e comportamentais (resistência à tentação em situações de transgressão). Ela iniciou então uma notável produção acadêmica que evidencia seu envolvimento com a Psicologia do Desenvolvimento. No campo do Desenvolvimento Moral, Biaggio foi pioneira e destacou-se como a mais importante pesquisadora do Brasil no assunto, por mais de três décadas.

Após o doutorado, Angela buscou verificar a aplicabilidade da teoria de Kohlberg entre os brasileiros, através de estudos científicos. Verificando a validade desta teoria para a interpretação dos dados colhidos entre os brasileiros, Biaggio passou a utilizar esta tipologia de forma sistemática em suas pesquisas sobre a moral. Aprofundou seu conhecimento sobre o desenvolvimento moral relacionando-o com as dimensões psicológicas. Verificou a influência do lócus de controle no julgamento moral. Analisou a relação entre ansiedade e julgamento moral e o vínculo entre personalidade e moralidade. Em outra linha de pesquisa, ela buscou verificar a influência de fatores sociais sobre o desenvolvimento moral.

Comunidade JustaEditar

Por ter interesse nas mudanças comportamentais, Biaggio procurou – através dos estudos de seu pós-doutorado com F. Clark Power – capacitar-se no uso da técnica de “Comunidade Justa”, criada por Kohlberg, com o objetivo de promover avanços no pensamento e na ação moral.

Essa técnica consiste em formar um grupo de 10 a 12 pessoas em diferentes estágios de desenvolvimento moral para discutir dilemas. A discussão do grupo seria guiada por um professor, psicólogo ou orientador educacional, que busca chamar a atenção para argumentos típicos de estágios superiores, podendo ser propostos por alguma pessoa do grupo ou pelo próprio coordenador.

Esse método promove a educação moral sem usar de doutrinação nem de relativismo. Evita a doutrinação porque impulsiona o desenvolvimento natural de estruturas universais que auxiliam na tomada de decisão de forma reflexiva e não na adesão a um conjunto determinado de crenças e valores, religiosos ou morais. Evita o relativismo, pois demonstra que os estágios de desenvolvimento moral são hierárquicos, de forma que um estágio superior é “melhor” ou mais “justo” do que o anterior.

De volta ao Brasil, Angela Biaggio tentou aplicar esta técnica, de forma adaptada à realidade brasileira, em uma escola em Porto Alegre. Porém, devido a várias mudanças na dinâmica dessa escola foi impossível concluir essa pesquisa.

ContribuiçõesEditar

Contribuições na PsicometriaEditar

Por sua dedicação nos estudos da ansiedade e da raiva, Angela adaptou e validou escalas para a avaliação desses aspectos para serem utilizada no Brasil. Ela realizou ambas as escalas em colaboração com Charles D. Spielberger. Referente à adaptação de medidas do julgamento moral, como as realizadas com o Moral Judgement Interview-MJI (medida subjetiva da moral, elaborada por Kohlberg) e ainda no desenvolvimento de instrumentos de avaliação psicológica, se apoiou no Sociomoral Reflective Objective Measure-SROM (uma medida objetiva de avaliação do julgamento moral) para realizar a adaptação e validação do instrumento para coleta de dados com amostras brasileiras.

Nos últimos anos de sua vida, estava desenvolvendo estudos para contribuir com uma versão adaptada de outra medida de moralidade, o Defining Issues Test 2 (DIT-2), sobre o qual apresentou uma pesquisa no simpósio no encontro científico da Association for Moral Education em Chicago, no ano de 2002.

Outras ContribuiçõesEditar

As contribuições de Biaggio não se restringiram aos estudos científicos sobre Psicologia do Desenvolvimento ou na Psicometria, Angela também contribuiu para o avanço da Psicologia no Brasil dedicando se à docência na PUC-RJ, UnB, PUC-RS e na UFRGS. Ela publicou três livros durante sua carreira, sendo eles: “Psicologia do Desenvolvimento” (1975), “Pesquisas em Psicologia do Desenvolvimento e da Personalidade” (1984) e “Lawrence Kohlberg: Ética e Educação Moral” (2002). Angela Biaggio publicou também diversos artigos em periódicos nacionais e estrangeiros.

Ela participou como coordenadora no Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), na Coordenação do Aperfeiçoamento de Pessoa de Nível Superior (CAPES) e no comitê da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS).

Durante sua trajetória acadêmica, Angela Biaggio manteve um forte intercâmbio com vários pesquisadores estrangeiros como Robert E. Grinder – orientador de seu doutorado –, F.Clark Power, Charles D. Spielberger, James Rest, Ann Higgins, ArneVikan, John F. Snarey, Lutz Eckens Berger, Orlando Lourenço, Georg Lind e Larry Nucci.

Produção AcadêmicaEditar

BIAGGIO, A. Uma comparação transcultural de estudantes universitários brasileiros e norte-americanos na medida de julgamento moral de Kohlberg. Arquivos Brasileiros de Psicologia Aplicada, n.27, p.71-81, 1973.

BIAGGIO, A. A developmental study of moral judgment of Brazilian children and adolescents. Interamerican Journal of Psychology, n.10, p.71-81, 1976.

BIAGGIO, A. Maternal and peer correlates of moral judgement. Journal of Genetic Psychology, n.135, p.203-208, 1979.

BIAGGIO, A. M. B. Pesquisas em psicologia do desenvolvimento e da personalidade. 1. ed. Porto alegre: Editora da UFRGS, 1984.

BIAGGIO, A. M. B. Desenvolvimento moral: vinte anos de pesquisa no Brasil. Psicologia: Reflexão e Crítica, n.1, p.60-69, 1988.

BIAGGIO, A. M. B. Relações entre maturidade de julgamento moral e ansiedade traço-estado. Arquivos Brasileiros de Psicologia, n.41, p.9-22, 1989.

BIAGGIO, A. M. B. Kohlberg e a comunidade justa: Desenvolvendo o senso ético e a cidadania na escola. Psicologia: Reflexão e Crítica, n.10, p.47-69, 1997.

BIAGGIO, A. M. B. Desenvolvimento moral, ecologia e pacifismo. (Simpósio). AME (Association for Moral Education), Minneapolis, Minn., 1999.

BIAGGIO, A. M. B. Psicologia do Desenvolvimento. Petrópolis: Vozes, 2009. (várias edições).

BIAGGIO, A. M. B.; GUAZZELLI, E. F. (1984). Relações entre maturidade de julgamento moral e lócus de controle. Arquivos Brasileiros de Psicologia Aplicada, 36, 63-73, 1984.

BIAGGIO, A. M. B.. Lawrence Kohlberg: Ética e Educação Moral. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2006. v. 1. 144p.

BIAGGIO, A. M. B.; MOROSINE, M. Reprodución, resitencia y pensamiento pos convencional: una comparación entre las teorias de Kohlberg y Giroux con respecto al papel de la escuela em la trasnfomación de la sociedad. Boletin de Psicologia (Universidad José Cañas, El Salvador), 1987.

BIAGGIO, A. M. B.; NATALÍCIO, L.; SPIELBERGER, C. D. Desenvolvimento da forma experimental em Português do Inventário de Ansiedade Traço-Estado de Spielberger. Arquivos Brasileiros de Psicologia Aplicada, n.29, p.31-44, 1977.

BIAGGIO, A. M. B.; SPADA, M. Relationship between maturity of moral judgment and the structure of personality: a test of Hogan: hypothesis with Brazilian subjects. Interamerican Journal of Psychology, n.16, p.23-30, 1982.

SCHUHLY, G.; BIAGGIO, A. M. B.; NERVA, G. B.. Motivação e desenvolvimento: adolescentes brasileiros de camadas populares: questões de socialização e educação. São Paulo: Edições Loyola, 1995.

SPIELBERGER, C. D.; BIAGGIO, A. M. B.. Manual do Inventário de Expressão de Raiva como Estado-Traço (STAXI): tradução e adaptação. São Paulo: Vetor, 1992.

Boletim do Portal História da PsicologiaEditar

Este verbete está publicado também no Boletim do Portal História da Psicologia, e pode ser acessado aqui

Referências bibliográficasEditar

  1. BIAGGIO, Angela Maria Brasil. Kohlberg e a "Comunidade Justa": promovendo o senso ético e a cidadania na escola. Psicologia: Reflexão e Crítica, Porto Alegre, Volume 10, número 1, p. 47-69, 1997.
  2. CAMINO, Cleonice. Angela Biaggio (1940-2003): Um Percurso na História do Desenvolvimento Sócio-Moral do Brasil. Psicologia: Reflexão e Crítica, Volume 16, número 01. Porto Alegre, 2003.
  3. DUARTE, Michael de Quadros (org) et all. Grandes Nomes da Psicologia Brasileira para Conhecer e Inspirar. Porto Alegre: PPGPSICO/UFRGS, 2019. pp. 10-13.
  4. O LEGADO Científico de Angela Biaggio (1940-2003) para o Brasil. Psicologia: Teoria e Pesquisa. Brasília, Mai-Ago 2003, Vol. 19 n. 2, pp. 187-188DUARTE, Michael de Quadros (org) et all.Grandes Nomes da Psicologia Brasileira para Conhecer e Inspirar. Porto Alegre: PPGPSICO/UFRGS, 2019. pp. 10-13.
  5. OLIVEIRA. Luciane Karine Guedes. Angela Maria Brasil Biaggio (1940-2003) – Verbete. Pioneiras das Ciências no Brasil - 6ª Edição. CNPq. 2021.

AutoriaEditar

Verbete criado, como exigência parcial para a disciplina de Psicologia do Desenvolvimento Cognitivo, da UFF de Rio das Ostras, por: Beatriz Campos Frazão, Fernanda Pereira da Costa, Igor de Abreu Portela Cunha, Laura Nobre de Azevedo Novaes, Talles Gomes dos Santos Silva. Verbete revisado por Clara Lyra Santos.